Editorial

Índia Mara Martins e Fabián Núñez

Resumo


Fora temer que o atraso de praticamente um ano na publicação é considerado um problema do ponto de vista acadêmico, a revista Rascunho do Departamento de Cinema e Vídeo da Universidade Federal Fluminense finalmente vem a público, após muitos percalços. Todos sabemos que 2016 foi um ano profundamente intenso, com inúmeras reviravoltas, gigantescos retrocessos, mobilizações, ocupações na Universidade, entre outros vários fatores. Apesar de o vórtice sociopolítico continuar a girar ainda em nosso País e Estado, os educandos do Curso de Cinema e Audiovisual da UFF prosseguem trilhando os seus percursos na Universidade, e entre suas ações está a escrita de monografias para a Conclusão do Curso.

Na presente edição, publicamos dezesseis trabalhos que obtiveram nota dez em suas bancas de avaliação em 2015.2 e em 2016, sobretudo em seu primeiro semestre.

Por ordem alfabética dos autores, apresentamos Alice Name Bomtempo Martins, com uma monografia intitulada “Memória e narrativa: as estratégias narrativas de encanto usadas para narrar a memória do eu e do outro”, orientada pela Profa. Dra. Ana Lúcia Enne. O trabalho analisa três documentários brasileiros contemporâneos, Jogo de cena (2007) de Eduardo Coutinho, Uma longa viagem (2011) de Lúcia Murat e Elena (2012) de Petra Costa, de aspecto extremamente pessoal por parte de seus realizadores. Ao lançar mão de um viés interdisciplinar, o estudo aborda os temas da memória e da performance, entre outros conceitos na análise fílmica.

“Os crimes de Bollywood: um estudo histórico sobre o trânsito das legalidades e ilegalidades na indústria cinematográfica indiana em busca por legitimidade” de Amanda Sayuiri Orlando Kadobayashi, orientada pela Profa. Dra. Índia Martins e co-orientada pela Profa. Ma. Marcela Amaral, traça um panorama da indústria cinematográfica indiana ao longo do século XX. Dos primórdios até a contemporaneidade, a pesquisa aborda a formação, consolidação e crise da indústria cinematográfica da Índia, centrada em Mumbai, e as suas inter-relações com o Estado e a sociedade.

Por sua vez, a monografia “O uso de elementos tipicamente ficcionais para a construção de narrativas em produções blue-chips” de Bruna Rafaela dos Santos aborda as produções audiovisuais de grande orçamento sobre vida selvagem. Orientado pelo Prof. Dr. Rafael de Luna Freire, o trabalho estuda o caso da série britânica Hidden kingdons (2014), ao analisar os procedimentos ficcionais utilizados na construção de personagens e ambientes, além de estudar a repercussão desse tipo de obra e as suas dimensões éticas.

Camila de Moraes Oka em seu trabalho “Consumo de ficção seriada e o modelo Netflix no Brasil”, orientado pela Profa. Dra. Ariane Holzbach, estuda as recentes transformações nos hábitos de consumo audiovisual do espectador brasileiro, em especial, em relação às séries ficcionais televisivas. Segundo as palavras de Camila, o propósito de seu estudo é entender “os motivos do sucesso do consumo de vídeo sob demanda no Brasil”.

Em “Sopranos e Breaking Bad: a construção do anti-herói na ficção seriada televisiva”, orientado pela Profa. Dra. Índia Mara Martins, Fernando Faria Mota dos Santos analisa a figura de protagonistas anti-heróis em duas ficções seriadas recentes na televisão. Assim, ao abordar as transformações sofridas pela mídia televisiva em suas relações com o espectador, a partir dos conceitos de “paleotelevisão” e “neotelevisão”, entre outros, Fernando analisa os procedimentos narrativos utilizados em ficções seriadas, em particular, a ambígua figura do anti-herói na função de protagonista.

O trabalho “Cinema soviético nos anos 30: uma comparação político-estética entre A felicidade e Entusiasmo na construção do “novo homem soviético”” de Gustavo Lucena de Queiroz, orientado pelo Prof. Dr. Fabián Núñez, se volta para um período tradicionalmente pouco estudado na cinematografia soviética: a década de 1930. Ao analisar os filmes Entusiasmo: sinfonia de Donbass (1931), primeiro longa sonoro de Dziga Vertov, e A felicidade (1935) de Alexander Medvedkin, Gustavo estuda as transformações estéticas sofridas no cinema soviético e as suas relações com as mudanças socioeconômicas ocorridas no país dos bolcheviques, a partir da implantação dos Planos Quinquenais e da consolidação da ditadura stalinista, que postula o advento do chamado “novo homem soviético”.

Helena Lopes Bera em seu trabalho “Afetos no cinema: o devir da intimidade familiar”, orientado pelo Prof. Dr. Cézar Migliorin, analisa documentários brasileiros contemporâneos que abordam relações familiares, mais especificamente “filmes de avós”. Ao chamar a atenção de que a instituição familiar é um tema recorrente na história do documentário, Helena estuda como a intimidade e o afeto são linhas-mestras na construção das narrativas no documentário contemporâneo.

O trabalho “Como criar personagens muito loucos: uma junção entre os manuais de roteiro e psiquiatria” de Leonardo Marmolejo de Luca, orientado pelo Prof. Dr. Tunico Amancio, se propõe a auxiliar os roteiristas na construção de personagens e situações referentes a transtornos mentais. Ao analisar manuais de roteiro e de psiquiatria, Leonardo busca relacionar cinema e saúde mental e, assim, estudar certos tipos de personagens e de gêneros fílmicos que abordam questões psiquiátricas.

Em “Autonomia e engajamento social: o documentário como possibilidade de criação de zonas autônomas temporárias”, de Lucas de Andrade Lima Britto, orientado pelo Prof. Me. Frederico Benevides, encontramos uma reflexão sobre os processos coletivos de criação artística na contemporaneidade e o fazer fílmico. Ao utilizar vários conceitos, tomando como fonte principal de ideias o livro “Zona Autônoma Temporária” do poeta e escritor político Hakim Bey, Lucas debate sobre o papel da arte como forma de buscar brechas às hierarquizações sociais, ao tomar como principal objeto de estudo o longa A vizinhança do tigre (2014) de Affonso Uchôa, realizado na periferia da cidade mineira de Contagem.

Lucas Maia Alves de Meira em sua monografia “Os manuais do diretor cinematográfico: uma análise da direção a partir das visões de cineastas e autores de manuais, da pré-produção à pós-produção” busca revisar e refletir sobre o ofício cinematográfico, da pré a pós-produção de um filme. Orientado pela Profa. Dra. Elianne Ivo Barroso e co-orientado pela Profa. Ma. Marcela Amaral, o trabalho parte da análise de dois tipos de material: reflexões e experiências de cineastas, como Vsevolod Pudovkin, Alfred Hitchcock e Andrei Tarkovski, e manuais sobre o ofício do cineasta, escritos por Myrl Schreibman, Judith Weston e Steven D. Katz. Assim, após tais análises, Lucas propõe refletir sobre o trabalho do diretor cinematográfico, durante as três principais fases do processo de realização audiovisual.

“O cinema sonha com filmes cyberpunks?” de Luís Gustavo de Souza Gomes dos Santos, orientado pelo Prof. Me. Daniel Pinna, realiza um estudo sobre a atmosfera fílmica em obras cyberpunks. Para isso, Luís Gustavo realiza uma genealogia do subgênero na literatura e na animação japonesa para se deter com maior ênfase no seriado de animação Psycho-Pass (2012-2013), dirigido por Naoyoshi Shiotani e Katsuyuki Motohiro.

A monografia “A revolução na arte, a arte na revolução: uma política da imagem no cinema revolucionário soviético”, de Quézia Maria Lopes Gomes da Silva, se debruça sobre o cinema forjado na Rússia a partir da Revolução de 1917 até o final dos anos 1920. Orientanda pelo Prof. Dr. Fabián Núñez, Quézia faz um estudo amplo sobre as características e as condições de uma proposta de cinema oriundo de um processo revolucionário específico, a Revolução Russa. Lançando mão do método dialético, o trabalho busca entender como uma concepção tão singular e complexa de cinema foi capaz de surgir na Rússia do começo do século XX.

Pedro de Alencar Sant'Ana do Nascimento em seu trabalho “Uma abordagem do cinema etnográfico de Rouch: métodos, filmes e críticas”, orientado pela Profa. Dra. Denise Tavares, estuda os filmes de Jean Rouch rodados na África Ocidental entre 1946 e 1960. A partir da hipótese de Deleuze de que o cinema de Rouch é uma “fuga de si mesmo”, são tecidas reflexões e críticas à filmografia do documentarista francês.

A monografia “Hiroshima mon amour: a vivência do esquecimento - um estudo sobre a representação da lembrança”, de Thaís Itaboraí Vasconcelos, era para ter sido publicada na edição passada, mas por razões misteriosas foi ironicamente “esquecida”. Fazendo jus à sua qualidade e às condições de publicação, o trabalho de Thaís, orientado pela Profa. Dra. Elianne Ivo Barroso, é agora editado. A monografia analisa o primeiro longa dirigido por Alain Resnais, ao estudar como é feita a representação da memória no filme.

O trabalho “Autoficção na narrativa cinematográfica: meio século entre Truffaut e Xavier Dolan” de Elisson Tiago Barros Amate, orientado pelo Prof. Dr. Maurício de Bragança, analisa as estratégias narrativas do cinema de autoficção. Para suas reflexões, Tiago estuda obras do cineasta francês François Truffaut e do canadense Xavier Dolan, buscando entender quais são os mecanismos de um “cinema do eu”, do cinema moderno ao contemporâneo.

Por fim, apresentamos o trabalho “O espaço visual no cinema: um diálogo entre as teorias de Bruce Block e o filme Que horas ela volta?” de Willian Nogueira. Sob a orientação da Profa. Dra. Índia Martins, Willian analisa o filme Que horas ela volta? (2015) de Anna Muylaert, a partir das ideias de Bruce Block sobre concepção visual no cinema.

Boa leitura!

Índia Mara Martins e Fabián Núñez

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